Karina Kuschnir

desenhos, textos, coisas

De volta para o futuro – rumo aos dez anos de blog

20 Comentários

Tudo isso era demais para mim, mas tia Melia mostrou-se maravilhosamente à altura da situação.

“Se pensa em tudo o que tem de fazer como se fossem coisas presentes à sua frente, que devem ser feitas todas ao mesmo tempo, acaba se estropiando.

O tempo obriga a gente a fazê-las em seqüência, uma de cada vez, e isso”, prosseguiu com a segurança de alguém que havia vencido por conta própria uma batalha igual,

“[isso] dissolve o peso quase inteiramente. Você é muito esperto e vai conseguir.”

Suas palavras calmas, quase sem emoção, mas de algum modo carinhosas, permaneceram desde então em mim, surpreendentemente úteis em épocas de crise súbita e desastre iminente, ainda que imaginário, quando os prazos finais de todos os tipos assomam diante de mim. (Edward Said, Fora do lugar, p. 247)

Pessoas queridas, quantas saudades. Sigo aqui e vocês aí, mas penso tanto em nossas conversas — passadas, presentes e futuras, como um fio mágico que nos une. Há tanto por retomar e tanto a propor.

Começo pelas palavras da tia de Edward Said, relatadas por ele em suas memórias. Mais do que o próprio autor, foi sua tia Melia quem ressoou em mim depois da leitura. Ela dedicou boa parte de sua vida auxiliando refugiados palestinos com menos recursos. Mesmo diante da tarefa imensa, soube acolher o pequeno, alimentar um de cada vez, achar um serviço aqui, um abrigo ali, ainda que isso não fosse salvar o povo inteiro.

Voltar a escrever o blog de forma descompromissada e cotidiana estava me parecendo uma tarefa impossível. Sabe quando a gente deixa a tese de lado para ir a um congresso e depois fica impossível voltar? Ou quando abandonamos a academia de ginástica depois de um resfriado prolongado? Então, imaginem essa paralisia multiplicada por mil. Não sei como medir o peso da pandemia em 2020, do burnout que vivi em 2021 e do luto que me inundou de 9/4/2022 até hoje.

Mas para quê medir, não é mesmo? Como o amor, a dor não pode ser medida. Todos temos as nossas, mais ou menos em carne viva ou cicatrizadas, talvez nunca só uma coisa ou outra. Tenho aprendido a deixar as minhas irem e virem, me colocando aos pouquinhos em movimento, sem estagnar.

Uma das minhas felicidades mais recentes foi voltar à sala de aula. Bem no dia do meu aniversário, comecei uma nova turma de antropologia e desenho, no IFCS/UFRJ, com direito a um final com visitas dos filhos, genros, alunos e um enorme bolo de chocolate. Divido com vocês a alegria desta grande-pequena festa, desejando secretamente 😉 (no assoprar da velinha) a retomada da nossa conversa: que a gente possa colocar o papo em dia, rumo aos dez anos do blog que se avizinha (6/11/2023).

Sobre a citação na epígrafe: Trecho das páginas 246-247 do livro Fora do lugar: memórias, de Edward Said (Companhia das Letras, trad. José Geraldo Couto, original de 1999).

Sobre o desenho: Aquarela de uma suculenta que achei abandonada em um vidrinho fofo no meu prédio durante a pandemia, feita em caderninho Laloran em 2020. Linhas em caneta Pigma Micron 0.05; pintura com tintas da minha paleta de várias origens. Minha inspiração foi a lindeza das cores da série do Lapin sobre as suculentas de sua varanda em Barcelona. Comprei o curso dele em uma promoção da Domestika (não é propaganda… me decepcionei com a maioria dos cursos dessa plataforma, menos esse rs). Achei que a plantinha resistente simbolizava bem esse tempo de espera do tempo de voltar a criar.

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Como citar: Kuschnir, Karina. 2023. “De volta para o futuro – rumo aos dez anos de blog“, Publicado em karinakuschnir.wordpress.com, url: https://wp.me/p42zgF-3Zp. Acesso em [dd/mm/aaaa].

20 pensamentos sobre “De volta para o futuro – rumo aos dez anos de blog

  1. Que bela surpresa receber uma notificação de seu retorno ao blog.
    Tantas angústias do lado de cá. Isso de dá um tempo, no meu caso na dissertação, por uma crise de ansiedade/Burnout e agora não conseguir retomar é uma delas.

    Grande abraço!
    Saúde!

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  2. Oi, Karina!

    Que alegria receber o e-mail divulgando seu novo texto! E que texto gostoso de ler!

    Você já me ajudou tanto por meio dos seus textos, então, vim tentar contribuir um pouquinho com você também.

    Conheci você em setembro ou outubro de 2020 por meio da Elizete Ignacio. Meu avô faleceu por causa das complicações da covid no final de julho desse mesmo ano. Naqueles meses, eu estava buscando alguma forma de voltar a viver, voltar a respirar, encontrar o sentido da vida. Você, em seus textos, foi umas das ajudas que encontrei para retomar as atividades do dia a dia. Muito obrigada por isso! Seus textos foram um bálsamo para a ferida escancarada e dolorida daquele momento.

    Achei que seria importante demonstrar a você todo o apoio que me deu! E tentar te oferecer um pouquinho de apoio também.

    Quando você contou do falecimento do seu companheiro, me identifiquei com a falta do meu avô. Estava ali você outra vez expressando com afeto todo o furacão que só a partida de uma pessoa amada é capaz de causar.

    Que bom que temos pessoas para amar! Que bom que fomos amadas! Nos resta agora continuar semeando esse amor e fortalecendo o afeto que anda em falta nesse mundão – e você faz isso aos montes!

    Faço das palavras da Karina do passado, as minhas para a Karina do presente: “Receba o meu abraço apertado, mesmo de longe, por tudo que você vem passando.”, diretamente do texto “Desistindo de (quase) tudo”.

    Um forte abraço em você!

    Ah, e peço licença para recomendar um livro que me ajudou a me reconstruir: “Zen a Arte de Viver com Simplicidade”, pode ser bom para você também!

    Com carinho, Giovana.

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  3. Tão bom te ler de novo, voltar a esse planeta de sensibilidade e delicadeza em que vc e Juva habitam para sempre… Obrigada, bjs

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  4. Parabéns Karina, pela volta,
    Inclusive, por se permitir… tanto se afastar quanto o voltar. As vezes, a pausa, o respiro, o se recolher é o necessário a se fazer.
    Acho os seus posts lindos de ver e ler, mesmo na dor, há uma poesia e uma escrita linda, sua e única.

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  5. Parabéns, Karina!!! Tão feliz pelo texto, pela surpresa que fizeram para você, pela aula de Antropologia e desenho…sigamos: ” Um passinho de cada vez….” Um cheiro no coração e um abração bem apertado que espero um dia dar pessoalmente!!!

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  6. Karina, parabéns e muitas felicidades. Obrigada pela escrita e pelos desenhos, e eu nunca fui tão fiel a uma leitura quanto aos teus escritos neste blog. Quando descobri essa junção, me achei, pois achava que meus textos, desenhos não condiziam com o que eu estava buscando no mundo acadêmico. Eu de fato achava que tinha algo errado comigo, mas ao te ler, e ver os teus desenhos, o mundo se fez mais bonito e liberto de todos os significados que damos a quem somos. obrigada e parabéns.

    Ab Thay

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  7. Querida comadre, me identifiquei muito com os seus momentos, pandemia, burnout, luto… estivemos distantes… nem nos falamos nos novos ciclos de sol Leonino e Virgo…. mas a certeza de amor não precisa de provas. Amei o texto, espero a visita com este livro pra emprestar e muitos a devolver… genros? Uau… Love you, blog de volta! Tamo junto! Bjbjbj Clau

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  8. Parabéns Karina..seus escritos sempre inspiradores. Podemos viver um dia de cada vez, assim chegar no futuro com os pés no presente, vivendo as alegrias e dores…assim podemos ser inteiros !
    Muitos escritos seus me ajudaram em momentos de angústias e também como luz no meu percurso acadêmico….gostaria que recebesse um abraço apertado de gratidão!!! E um abraço de feliz aniversário.Você é muito necessária…seusescritos e desenhos dariam um belo livro ou vários livros…

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  9. Meus parabéns, querida Karina! Sempre doce e instigante.

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  10. Parabéns, felicidades!

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  11. Karina, eu amo ler sua escrita. Queria que você publicasse um livro pra poder ter um exemplar físico em casa. Feliz aniversário atrasado. Você é tão necessária nesse mundo. Obrigada por tudo! Abraços carinhosos!

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  12. Karina, Parabéns! Feliz aniversário! Bom te ler de volta. Achei lindo o desenho. Tenho um vidrinho fofo igual ao do desenho. Ganhei de uma amiga que faz geleias artesanais. A geleia acabou e o vidro não tive coragem de dar embora. Para você ter ideia, ganhei ele quando morava no Mato-grosso e ele continua comigo ainda hoje comigo morando em São Paulo. Passei por uma separação com o pai do meu filho, enfrento o luto pela morte da minha mãe, mudei de casa algumas vezes, mas ele continua. Guardo açúcar nele, de propósito, porque seu formato me lembra abelhas e o mel que elas produzem. E também porque traz uma memória afetiva e doce. Adorei a possibilidade de plantar algo nele, mas sou um desastre com plantas.

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    • Que legal, Taimara. Obrigada por compartilhar 💕 . Planta uma pequena babosa ou aloe vera. Elas são difíceis de matar 😅. Adorei seu blog!

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  13. Feliz de receber teu texto! Já tinha comemorado teu niver no dia (postagem), mas a foto linda merece comemoração: Viva 🥂!!!

    Obrigada, sempre

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  14. Que delícia ver seu post, Karina. Suas palavras e imagens são sempre lindas e iluminadas!

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