Karina Kuschnir

desenhos, textos, coisas


9 Comentários

A dádiva daquele instante – Torto Arado

“Diante dos meus olhos, vi minha mãe erguer sua mão direita e segurar com força o braço que avançava rompendo o ar para lhe atingir. Bastou esse gesto para que cessassem os urros e a cólera da mulher, e um fluxo de serenidade se instaurasse entre os presentes.” (Itamar Vieira Jr., Torto arado, p.59)

Li Torto arado em fevereiro de 2021. Ah, como sonhei em ser segurada pelos braços dessa mãe… Era em mim que ela derramava seu “milagre de energia”, serenando o mundo, por dentro e por fora.

Foi na época em que vivíamos a segunda tsunami pandêmica, falta de vacinas e o sufocamento em Manaus. Não preciso explicar, vocês sabem. Na versão particular desse pesadelo, tive um descolamento de retina e espiralei para aquele tipo de doença que todos os médicos diagnosticam como “stress” e te dizem para “relaxar”. Ah, tá.

Itamar Vieira Jr. chegou fazendo a mágica dos grandes escritores: trouxe paz e esperança, força e suavidade, susto e sossego. Fez surgir pessoas inteiras, complexas, encantadas. Lembrou-me de certezas que eu já julgava impossíveis — de que existem o bem-querer, o barro, o estudo, o rio e os milagres.

“O desalento que se abateu sobre todos com a prolongada estiagem contrastava com o sopro de vida que tudo aquilo poderia ser para nós.” (p. 79)

Essa frase traduz, pra mim, a vida seca e fértil de 2021. Foi ano de doença e morte, de ciência e vacina. Pudemos chorar de ódio, medo e dor, mas também de emoção, conforto e alegria.

Quem não derramou lágrimas na primeira dose? Eu e a moça do posto choramos. Até então, prevalecia o desespero, “como se o arado velho e retorcido percorresse as minhas entranhas, lacerando a minha carne” (p.127).

Torto arado trouxe uma energia que estava ali e não se via. Nas palavras de Zeca Chapéu Grande:

“Se o ar não se movimenta, não tem vento. Se a gente não se movimenta, não tem vida (…).” (p. 99)

Pensei na necessidade de me mexer. A terapeuta falou disso. A energia está dentro da gente. Ok, falta um mapa, mas é melhor do que o “relaxa” dos médicos. O único movimento em que eu conseguia pensar nessa época era fugir. Só que não dava, né? Pra onde? Como dizem sobre o lixo, não existe o fora no planeta terra.

Lembrei dos meus antepassados que escaparam da falta de perspectiva e das perseguições religiosas. Pensei no meu avô que ainda por cima fugiu sozinho. “O sangue do passado corre feito um rio”, escreve Itamar, sobre veias abertas há mais de 500 anos. Só que a fuga aqui não é medo: é coragem. As personagens do livro têm aquela força heroica que nos falta:

“Vocês podem até me arrancar dela como uma erva ruim, mas nunca irão arrancar a terra de mim.” (p. 230)

É tão bom que Torto arado seja novo e traga verdades tão antigas, como a história que conta: “triste mas bonita”. É tão reconfortante que possamos ler e imaginar possibilidades; movimentar não apenas o corpo mas os pensamentos na direção de algo bom:

“Juntas fecharam os olhos e compartilharam a dádiva daquele instante.” (p.258)

Os livros tiveram esse efeito sobre mim em 2021: seguraram minhas mãos e me enlaçaram em seus braços, como Bibiana faz com Belonísia na cena citada acima. Foram 68 volumes; 68 dádivas a me trazer para o instante.

Coisas:

♥ Livro citado: Torto arado, de Itamar Vieira Junior. Editora Todavia, 2019. (Desenho da capa da talentosa artista Linoca Souza).

♥ Lista simpática do The Guardian de 100 coisas para melhorar a vida um pouquinho em 2022.

♥ A dica acima foi do Instagram da Helô Righetto. Além de stories sobre Londres, caminhadas e plantas, a Helo faz ótimas recomendações de livros (reunidas na #HeloReads). Em 2021 ela até gravou (com a Rapha Perlin) um simpático podcast de 8 episódios sobre Jane Austen.

Sobre o desenho: Desenho feito com canetinhas Pigma Micron 0.05 e 0.1 no verso de uma folha do bloco A4 XL Aquarelle Canson (capa turquesa). Cores feitas com aquarela e lápis de marcas diversas. Quis imaginar as irmãs saindo de dentro do livro, talvez para mostrar o quão vivas elas me pareceram em suas páginas. Escaneei na impressora Epson L396 (que não recomendo pois vive dando problema) e depois editei um pouquinho no Photoshop. Não consegui acertar as cores do original na tela, mas segue assim mesmo. Até porque esse blog é um espaço de amor; e amor não combina com vaidade, concordam? ☼

Você acabou de ler “A dádiva daquele instante – Torto Arado“, escrito e ilustrado por Karina Kuschnir e publicado em karinakuschnir.wordpress.com. Se quiser receber automaticamente novos posts, vá para a página inicial do blog e insira seu e-mail na caixa lateral à direita. Se estiver no celular, a caixa de inscrição está no rodapé. Obrigada! ☺

Como citar: Kuschnir, Karina. 2022. “A dádiva daquele instante – Torto Arado”, Publicado em karinakuschnir.wordpress.com, url: https://wp.me/p42zgF-3To. Acesso em [dd/mm/aaaa].


23 Comentários

Calendários 2020 de Janeiro a Dezembro

2020_p

Para quem gosta de imprimir os calendários, seguem abaixo os PDFs de todos os meses de 2020 para download:

Janeiro, Fevereiro, Março, Abril, Maio, Junho, Julho, Agosto, Setembro, Outubro, Novembro, Dezembro.

Utilizei imagens anteriores, aproveitando o Photoshop para acertar as cores, ocupar melhor os espaços e clarear o branco do papel. Também marquei com desenhos os principais feriados de 2020 no Brasil. Espero que gostem!

Quem sabe agora vou começando a desenhar 2021 no ritmo certo: com calma. ♥

Muito obrigada pelas mensagens tão positivas pelo post de ontem. Continuar a desenhar e escrever voluntariamente aqui no blog é um dos meus focos de 2020.

Minha palavra-chave nos últimos anos têm sido “força”, mas estou cansada de tentar ser forte o tempo todo. Pra 2020, estou querendo liberdade e leveza.

passaros1

Revendo os calendários, amei os passarinhos que ficaram no mês de abril. Essa duplinha fofa (acima) parece que tá conspirando: — Bora voar?

Seguem todos os meses em imagens para vocês verem melhor:

2020-012020-02

2020-032020-04

2020-052020-06

2020-072020-08

2020-092020-10

2020-112020-12

Sobre os desenhos: Quase todos os desenhos foram feitos com canetinha nanquim à prova d’água 0.05 (Pigma Micron ou Unipin) e coloridos com lápis de cor em papel A4 90gr comum. O único mês feito com marcadores é o de maio (tema Matisse), pois as cores tinham que ser bem fortes e sem textura.

Você acabou de ler “Calendários 2020 de Janeiro a Dezembro“, escrito e ilustrado por Karina Kuschnir e publicado em karinakuschnir.wordpress.com. Se quiser receber automaticamente novos posts, vá para a página inicial do blog e insira seu e-mail na caixa lateral à direita. Se estiver no celular, a caixa de inscrição está no rodapé. Obrigada! ☺

Como citar: Kuschnir, Karina. 2020. “Calendários 2020 de Janeiro a Dezembro”, Publicado em karinakuschnir.wordpress.com, url: https://wp.me/p42zgF-3NC. Acesso em [dd/mm/aaaa].


17 Comentários

Resiliência

paisagem_p

Uma das coisas mais difíceis na vida é recomeçar — cair, levantar, insistir, fazer, mesmo quando o corpo dói e a tristeza invade.

Mergulhei numa espiral de desalento e apatia, alternada com breves momentos de energia e ação. Começou com o incêndio do Museu Nacional e veio se arrastando. Não sei vocês, mas meu desânimo costuma gerar medos, pesadelos, noites insones e um vício amargo pela tela do celular.

Não recomendo.

Tive forças por saber que já fui e já voltei algumas vezes desse labirinto.

Aprendi tarde que existia uma palavra pra isso: resiliência. É aquela capacidade do boneco João-Teimoso de voltar a ficar de pé mesmo quando o empurramos ao chão.

A diferença é que, ao contrário dos seres humanos, o João-Teimoso é construído pra isso. E nós? Como voltamos a sorrir e a acreditar? Como retomamos o trabalho de ter ideias, escrever, publicar, estudar, ensinar?

Pra mim, está sendo um processo. Tem o tempo. Tem as mãos e os abraços dos meus amores. Tem a força e a cumplicidade dos estudantes. Os áudios dos amigos no zap. Tem a aquarela e o trabalho. Tem medicação para os momentos de emergência.

Ainda estou desconcentrada para leituras longas; e ainda estou insegura com um monte de coisas.

O que me ajudou a sair da inércia e vir aqui hoje foi pensar em todos que estão angustiados tentando escrever trabalhos de curso, TCCs, dissertações, teses, artigos e até relatórios pra Fapesp…

Amores, eu precisava vir aqui dar um abraço em vocês, e receber esse abraço também.

Como nos diz lindamente a artista Lisa Congdon:

“Compareça, respire, faça o seu melhor, seja gentil, aprenda, repita.”

Prometo voltar, prometo não desistir, prometo que vamos rir disso tudo um dia. Combinado?

Sobre o desenho: Aquarela sobre o verso de uma amostra de papel Hahnemühle (Expression). A imagem foi feita a partir de lembranças daquelas paisagens que vemos do avião quando estamos prestes a pousar em alguma cidade bonita. Sempre tirei fotos dessas vistas, principalmente quando são campos e plantações. É um tipo de pintura bem terapêutica, sem regras, sem pensar muito.

Sobre resiliência: Na Wikipedia tem um verbete interessante na área da psicologia:

“A resiliência é a capacidade de o indivíduo lidar com problemas, adaptar-se a mudanças, superar obstáculos ou resistir à pressão de situações adversas – choque, estresse, algum tipo de evento traumático, etc. – sem entrar em surto psicológico, emocional ou físico, por encontrar soluções estratégicas para enfrentar e superar as adversidades.”

Você acabou de ler “Resiliência“, escrito e ilustrado por Karina Kuschnir e publicado em karinakuschnir.wordpress.com. Se quiser receber automaticamente novos posts, vá para a página inicial do blog e insira seu e-mail na caixa lateral à direita. Se estiver no celular, a caixa de inscrição está no rodapé. Obrigada! ☺

Como citar: Kuschnir, Karina. 2018. “Resiliência”, Publicado em karinakuschnir.wordpress.com, url: https://wp.me/p42zgF-3IT. Acesso em [dd/mm/aaaa].


17 Comentários

Novembro/2018 – Girassóis

nov2018_p

Os girassóis são flores incríveis, conhecidas por se movimentar como se estivessem olhando para o sol. Em dias nublados, se viram uns para os outros, buscando energia. Mesmo quando não há luz, se fortalecem por estarem juntos.

Retomo o blog com essa metáfora, agradecendo a força que emana de vocês. Cada clique, visualização, download, mensagem e, sobretudo, cada sorriso e abraço recebidos na vida real ou virtual é uma fonte de energia para seguir em frente.

Sintam-se acolhidos e abraçados de volta! Estamos juntos e somos resistentes!

Nesse mundo da pós-verdade, precisamos reafirmar o básico. Quais valores defendemos, quais princípios consideramos inegociáveis? Como diria uma criança de cinco anos: — Qual é o sentido da vida?

Que os girassóis nos respondam por hoje: — O sentido da vida está na cooperação, no compartilhamento e na luz.

Nesse mês, coloquei uma flor extra no dia 20, feriado que marca a homenagem a Zumbi dos Palmares, transformado recentemente no Dia da Consciência Negra. Os 388 anos de escravidão de negros e indígenas no Brasil não podem ser esquecidos. A liberdade é um dos pilares da Constituição de 1988, um bom livro de cabeceira para ler e reler sempre.

Aqui vai o calendário do mês de novembro para imprimir em .pdf (em alta resolução).

Que tenhamos um mês de foco e concentração. Meus objetivos de novembro: ler, escrever, estudar, ser a melhor funcionária pública que eu puder, contribuir para projetos sociais, fortalecer meus valores, abraçar meus amores e amigos.

E os objetivos de vocês, quais são?

Sobre o desenho: Fiz um girassol com base em fotos do Google. Desenhei um original de cerca de 3 cm numa folha A4 90gr, com contorno de canetinha 0.05 Pigma Micron, colorido com lápis-de-cor Polychromos. Escaneei a folha do mês e o desenho, copiando a flor em vários tamanhos, e depois juntando tudo no Photoshop.

Sobre girassóis: Recomendo muito a leitura de Van Gogh, Digitalis e a verdade sobres os girassóis, capítulo disponível online do livro maravilhoso de Luiz Mors Cabral que já comentei aqui.

O texto do post é inspirado na mensagem (abaixo) que recebi e também na imagem que minha querida professora de aquarela Chiara Bozzetti me enviou:

girassois

Você acabou de ler “Novembro/2018 – Girassóis“, escrito e ilustrado por Karina Kuschnir e publicado em karinakuschnir.wordpress.com. Se quiser receber automaticamente novos posts, vá para a página inicial do blog e insira seu e-mail na caixa lateral à direita. Se estiver no celular, a caixa de inscrição está no rodapé. Obrigada! ☺

Como citar: Kuschnir, Karina. 2018. “Novembro/2018 – Girassóis”, Publicado em karinakuschnir.wordpress.com, url: https://wp.me/p42zgF-3IH. Acesso em [dd/mm/aaaa].