Karina Kuschnir

desenhos, textos, coisas


4 Comentários

Respirar, escrever, pontuar. E feliz dez anos do blog!

Já nas alturas, pára e respira. Quão difícil é subir a um monte. Que difícil é a busca de um espaço. Que difícil é a busca de si própria. Chamou a si todas as forças e continuou a subir.” (Paulina Chiziane, O alegre canto da perdiz, p. 211)

A maior dificuldade de escrita dos estudantes é com a pontuação. Não sei se sempre foi assim. Será que é mais um dos sintomas de pandemia prolongada. O ar nos faltou tanto que temos dificuldade de parar para respirar de novo.

Vou dar um exemplo. Pedi para os alunos descreverem acontecimentos do seu cotidiano. No trecho abaixo, demonstro os sinais da enfermidade (com redação fictícia):

“A consulta médica foi como esperado, conversamos sobre os sintomas e houve uma espera menor do que da outra vez e aí minha mãe chegou após o trabalho, e tivemos que ir ao ponto de ônibus mas não estava tão quente e foi agradável segurar sua mão e sentir seu apoio.”

Dá para entender? Dá. Mas pobres leitores! O problema é que 90% dos estudantes escrevem assim. Não é falta de conteúdo, na minha opinião. É falta de ar, de pausa, de respiração. Também não é pouca leitura. Eles lêem muito, mas lêem correndo, como escrevem. Tudo é com pressa, como os vídeos do Tik Tok.

Não tenho esse aplicativo, mas há uma tiktokização das outras redes sociais: o reels do Instagram, os shorts do YouTube. Eu tinha jurado que nunca veria um “shorts”. E ontem fiquei hipnotizada por uma hora nessa armadilha.

Costumo pesquisar dúvidas no YouTube, conforme aprendi com meus filhos. O microondas aqui de casa está sempre com a hora certa por isso. Agora até o YT responde com mini-vídeos. E depois que você vê o primeiro não consegue mais parar. É como um grande parágrafo sem ponto.

Não adianta chamar um teórico da literatura para dizer que é “fluxo da consciência”, porque você não pensou nada daquilo. O algoritmo pensou por você e te tragou para dentro dele. Aconteceu comigo ontem. Não sei o que fiz entre as 22 e as 23 horas.

Acordei de ressaca, ansiosa por um antídoto. Revi leituras das últimas semanas. E cheguei às palavras de Paulina Chiziane que abrem esse post: que difícil é viver, lutar, cansar, parar e mesmo assim continuar. Sento para escrever. Criar é uma cura.

Respiremos!

Dez anos de blog — Obrigada!

No dia 6/11/2023 foi aniversário de 10 anos deste blog! ♥️ Obrigada por estarem aqui, pela companhia desde 2013, pelas dezenas de conversas e calmaria. Agradeço o carinho! Eu tinha me programado para escrever um post bem especial sobre concursos em comemoração, mas meu gatinho Charlie ficou doente. Ele já está bem. Em breve o post sai. Será uma parceria com a Manó (@itsme_mano) surgida no nosso grupo no Telegram, Abraço acadêmico.

Que nosso sonho de uma vida acadêmica mais cooperativa e solidária continue gerando frutos! Obrigada por tudo 💌

Projeto “Como escrever um texto em 8 meses” (Semana 4/36) — Desde o último post, escrevi zero palavras! Hahaha. Foi produção de feriados, gatinho doente, leituras de romances e sequestro de mini-vídeos. Ah, tenho a desculpa de que Alice fez Enem! Serve? Não, né? Foi ela quem fez as provas. Minha curva de produtividade só não está pior porque eu pensei. Sim, gente, pensar cansa e dá trabalho. Requer respiração e amadurecimento. Consegui decidir o tema do que pretendo escrever. Já contei para vocês que este será o texto da minha promoção para professora titular? Eu estava com receio de me expor. Mas decidi que não faz sentido fazer um diário de escrita sem explicar o que me espera no final do projeto. Ano que vem completo o tempo de docência necessário para concorrer ao cargo na UFRJ. Preciso escrever um memorial e uma conferência. O primeiro não me preocupa (sou uma otimista para textos pessoais). Já a segunda tem que ser algo publicável. Como diria o Juva, tem que ter brios. Vamos a isto.

Sobre a citação de Paulina Chiziane: Trecho da página 211 (versão eletrônica) do romance “O alegre canto da perdiz”, de Paulina Chiziane (edição Caminho, Portugal, 2008). É o segundo livro dessa autora maravilhosa que conheci por indicação da querida Sarah Toledo, do Sarices. O blog dela está em pausa, mas tem posts maravilhosos sobre literatura lá. E a Sarah também é professora de espanhol. Da Paulina Chiziane, li também o Niketche. São excelentes e muito diferentes um do outro. Adorei ambos, mas acho que prefiro o estilo mais realista e engraçado de Niketche.

Sobre o desenho: Caixinha usada de lenços Kleenex feita com canetinha 0.05 (bem gasta) da Pigma Micron. Trouxe a imagem da página inteira (acima) porque esse desenho foi feito em um bloco Canson A5, papel branco 90gr, que não se encontra mais pra comprar. As cores foram feitas com lápis de cor. Adoro desenhar objetos do cotidiano e perceber seus detalhes. Vocês já tinham lido a legenda “dia a dia” abaixo da marca? Enquanto desenhava, escrevi algumas notinhas sobre o Juva em janeiro de 2022. Foi muito triste de reler, mas a Paulina Chiziane me socorreu:

“Amar é também abrir a mão e deixar partir. Amar é ganhar e perder. É aceitar semear-se para germinar noutra encarnação.” (Paulina Chiziane, O alegre canto da perdiz, p. 77)

Você acabou de ler “Respirar, escrever, pontuar. E feliz dez anos do blog!”, escrito e ilustrado por Karina Kuschnir e publicado em karinakuschnir.com. Se quiser receber automaticamente novos posts, vá para a página inicial do blog e insira seu e-mail na caixa lateral à direita. Se estiver no celular, a caixa de inscrição está no rodapé. Obrigada! 

Como citar: Kuschnir, Karina. 2023. “Respirar, escrever, pontuar. E feliz dez anos do blog!”, Publicado em karinakuschnir.com, url: https://wp.me/p42zgF-41P. Acesso em [dd/mm/aaaa].


10 Comentários

Expirar, escrever, desenhar

metro3_p

Há muitos anos atrás, aprendi que uma crise respiratória pode ser por “excesso de ar” nos pulmões, e não falta. A aflição nos faz de tentar inspirar, quando na verdade precisamos expirar, de preferência bem devagarinho.

Descobri que existe também a “aerofagia”, dor e enjôo causados quando se respira muito pela boca, deixando o estômago cheio de ar. Sintoma típico de ansiedade. Até ar em excesso nos adoece.

Imaginem o nosso nível de intoxicação atual… Preocupação extrema, stress, tristeza, sensação de impotência… Quem não está sentindo tudo isso com o nível obsceno das ações governamentais no Brasil? Acrescentem uma dose extra se vocês moram no Rio de Janeiro…

Não tenho soluções, só tentativa de sobrevivência. É a minha versão de receita tipo-bela-gil: “você poderia trocar o consumo de notícias,  vídeos e posts horríveis por…escrever e desenhar”.

Voltei a escrever um diário em papel, no mínimo três páginas A5 por dia. Achei um caderninho usado aqui em casa, pautado, daqueles bem baratinhos da Tilibra. Ando com o telefone grudado nele e na minha caneta de escrita preferida, uma bic azul cristal ultra fine. Toda vez que sinto um impulso de pegar no celular, olho os dois objetos e penso: abro a tela e vejo mais uma atrocidade, ou abro o caderno e escrevo sobre uma ideia, um sonho, qualquer coisa? O caderno, gente. Escrever está sendo como expirar as toxinas… Às vezes estou num dia tão difícil que sigo acrescentando parágrafos em vários momentos. Está sendo uma auto-terapia.

Voltei também a desenhar no metrô, observando as pessoas com a compaixão que o registro gráfico exige. Registrar o corpo de alguém no caderno é uma forma de expirar o que vejo, um pequeno traço por vez. Além das imagens no início do post, seguem algumas cabeças… Parecem cansadas, como eu. Sinto-me menos só.

metro2_p

Para quem acha que não sabe desenhar (desde já, discordo!): vale recortar e colar, contornar, colorir mandalas. Qualquer coisa analógica serve: tricotar, bordar, cozinhar, pintar, brincar de massinha ou cerâmica. A ideia é fazer “algo para fora”, ao invés de colocar mais coisas para dentro.

Boa semana! ♥

2 Coisas impossivelmente-legais-bonitas-interessantes-e-dignas-de-nota dos próximos dias:

solvermelho• Estreia amanhã, 19/08/2019, a exposição “O nosso sol é vermelho”, do Antônio Kuschnir! (Meu filho, para quem não sabe!) Será na Galeria Macunaíma, na Escola de Belas Artes da UFRJ (1º andar do Prédio da Reitoria, na Cidade Universitária), onde ele estuda. Vai ser incrível!

Para quem não conhece o trabalho dele, vocês podem ter uma amostra no Instagram ou no Facebook, mas nada como ver ao vivo — é lindo demais:

https://www.facebook.com/antonio.castro.9231712

https://www.instagram.com/antoniokuschnir/

• Está aberta até o dia 30/08/2019 a campanha de financiamento coletivo para a reconstrução da Biblioteca Francisca Keller, do PPPGAS/Museu Nacional, uma das preciosidades perdidas no incêndio do prédio. Qualquer valor é importante: https://www.bfkmuseunacional.org/

bfk2

Sobre os desenhos: Pessoas desenhadas com canetinha de nanquim permanente Staedtler 0.5, num caderninho Hahnemühle A6. Acrescentei a aquarela em casa, com toda calma, deixando secar uma camada antes de pintar a próxima. Em quase todas as cores, acrescentei um fiapinho de Lunar Black, uma tinta nova na minha paleta, que uma amiga me trouxe dos EUA em janeiro. Estou amando, pois ela cria um granulado lindo por onde passa. Depois conto mais sobre alguns materiais novos porque o objetivo de hoje é fechar a semana com o post publicado! Abraço apertado, pessoal. Tirem o pó dos cadernos, das tintas e dos pincéis. Recomendo. ☼

Você acabou de ler “Expirar, escrever, desenhar“, escrito e ilustrado por Karina Kuschnir e publicado em karinakuschnir.wordpress.com. Se quiser receber automaticamente novos posts, vá para a página inicial do blog e insira seu e-mail na caixa lateral à direita. Se estiver no celular, a caixa de inscrição está no rodapé. Obrigada! ☺

Como citar: Kuschnir, Karina. 2019. “Expirar, escrever, desenhar”, Publicado em karinakuschnir.wordpress.com, url: https://wp.me/p42zgF-3Mf. Acesso em [dd/mm/aaaa].